domingo, 8 de dezembro de 2013

Is it lonely?



Tem coisas que são duas ao mesmo tempo, ela e seu antônimo. Por exemplo: solidão e companhia; vida e morte. Uma está contida na outra, uma depende da outra para ser o que é. É como um copo com líquidos imiscíveis, e à medida que um se esvazia o outro ganha mais volume (ou seria um copo esvaziando?).
Ou seria um copo esvaziando?

Muita gente distante, mas algo importante, morreu pra mim esses dias. Quero dizer, eles morreram faz tempo, ou nunca nem existiram, mas para mim foi esses dias. O Chris McCandless (o coitado é meio que meu cristo, já morreu tantas vezes), o Cazuza, a baleia (do Fabiano, da Sinhá Vitória), tanta gente no caminho do Severino (da Maria, do finado Zacarias). Todos daquela morte magra, que se anuncia pelos ossos e a pele. Eu nunca fui muito de me preocupar com a morte (meu copo já tem uma porcentagem dela, afinal), mas os ossos e a pele me deixam impressionada. É como se de repente os líquidos deixassem de ser imiscíveis e a vida ganhasse um pouco a cor da morte.
As moscas... Malditos urubus. Eu não gosto como a vida às vezes anuncia precocemente a morte. Talvez tenha que me acostumar com isso.

Eu nunca realmente me preocupei com um depois. Tem tanta vida na vida pra gente se ater, pra mim nunca fez muito sentido pensar num possível após – cada coisa a seu tempo. Mas vendo meu cãozinho assim, não posso evitar pensar no sopro final (na última gota do copo). Como será que se sente isso? – veja, o depois ainda não me preocupa. Mas a pele e os ossos, como será isso na pele e nos ossos?
Fome dói. Eu tive uma curta experiência de fome na vida (verdadeira, não essa que dá antes das refeições, claro), um dia ápice na estrada, depois de alguns dias comendo uma pequena refeição por dia e umas bolachas soltas. Naquela manhã tínhamos comido duas bolachas recheadas e um pêssego, já eram 15h e seguíamos andando embaixo do sol. Foram poucas horas de fraqueza, forte incômodo no sistema digestório, e um puta desânimo. Pouco depois estava me enchendo de balas de coca-cola na camioneta do senhor Delfin – e a energia que essas poucas balas me deram foi impressionante.
 É, não foi tão verdadeira assim. Até porque ainda devíamos ter alguma geleia e massa de macarrão que estávamos guardando para o caso de não conseguirmos sair da estrada naquele dia – ainda que só tivéssemos uma garrafinha d’água, naquele momento. No dia seguinte estava me esbaldando de pão com ovo e mate. Mas no momento aquela garrafinha d’água e as bolachas me fizeram entender um pouco melhor a dimensão que a fome pode ganhar.

Dizem que num certo momento você atinge uma euforia anestesiante, e tudo vira transcendência. Tem também aquela clássica história de que passa um curta-metragem da sua vida. Será a morte a transcendência plena? A hiperconsciência? O tornar-se o todo?
Is it lonely?

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Verão amor – cantada úmida



Bonito ia ser se o verão trouxesse essas pancadas de chuva de 20 minutos, que refrescam, deixam com cheiro de terra e vontade de mar. E bonito ia ser se os pingos gordos te levassem neles, todos eles levando um fragmentinho de luz do teu sorriso, o mesmo verde-mistério dos teus olhos, a textura leve dos teus cabelos, saciando a sede e o calor, como tua boca, teu corpo.
Bonito ia ser a gente em qualquer canto do mundo – onde haja água, cachoeira, mar – brincando de fazer verão, primavera, provocando todas as estações em nós dois, construindo desertos e oásis com nossos sentidos, desenhando animais em nuvens de algodão-doce que se dissolvem na saliva e aproveitando os redemoinhos das nossas ideias conjuntas para empinar pipas com os vitrais sagrados daquilo que parecia intocável.
A gente devia era aproveitar, com empolgação infantil, o frescor que dá na barriga quando o estômago balança que nem rede de praia no embalo das emoções; correr longe, até o horizonte de nós, com os pés dos olhos, e nos fundirmos em cor e luz num ocaso da razão individual, acampando na areia e esperando com incenso de citronela e um tereré fresquinho o raiar do nosso amor.

domingo, 10 de novembro de 2013

La playa de Neruda



Usted, mi amor, en verde y azul. Usted iluminado por la tibia luz del anochecer, en esta puesta del sol en la playa, su playa y hogar.
El mar susurra su poesía… ¿Para qué decir la canción de un corazón que es tan pequeño? Está a mi lado. Siento que está aquí conmigo, en esta piedra, con bichitos caminando en los pies, con frio, con el pie cortado, pero no le molesta – como no me molesta – porque el viento, el sol y el mar no nos dejan molestarnos.
Estar solo puede ser estar acompañado de todo el mundo. Mismo de aquellos que ya no están.
Me hace gracia pensar que, en este momento, tengo ganas de decirte unas palabras de Vinicius de Moraes. Mi otro maestro y compañero. Llevo uno en cada brazo, los dos en el pecho. Que es verdad que se lo comparten con otros tantos, pero, bien, nadie mejor que ustedes para comprenderme.
Dime, poeta, ¿qué hago del amor? ¿Cree que la vida va a regalarme mi Matilde?
Yo a veces pienso que he nacido para amar el mundo, la vida, todas las personas, y quizás eso me impide de tener una pareja. Quizás no, pero entonces tengo que encontrarme alguien igual libre y enamorado de la vida. Que tenga ganas de sentarse en una piedra, en el frio, con el pie cortado, solo para mirar el mar y decir algunas palabras sueltas. Y entonces, bien, capaz que pueda calentar mis manos que están tan frías.
Dos perros se acercan, y con ellos una pareja. Y así se hace la playa de Neruda. Tengo un perro para hacerme compañía – aquí siempre hay buena gente y animalitos dispuestos a acompañarme, así que nunca estoy sola. Gracias.
El sol está casi en la línea del horizonte. El espectáculo que la naturaleza regala todos los días a las miradas listas. Estoy cierta de que esto le sembró muchas poesías.
El globo amarillo se acuesta en el agua. Desaparece calmamente. Y con él se van mis preocupaciones. 
 

 
20 nov 2011 - Isla Negra

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

¿Y qué buscas?



¿Y qué buscas?
Não precisou de mais que isso. Todos buscan algo, principalmente cuando viajan. ¿Qué buscas?
De tudo o que ouvi – e foi muito, e de gente muito sábia – isso que soou o resto do mês, isso que soa sem parar.
Era tucumano, moreno, cabelo longo, barba cheia, e pareceria algo com o Obelix, não fosse o fato de ter aqueles lindos traços autóctones do norte da Argentina. Buena onda, definitivamente buena onda. Regado a fernet cola e outros drinques que a noite trazia.
Tranquilidad, paz. Essa não era minha resposta primeira, mas ele já sabia muito bem qual era minha resposta e esperava por ela para dar um desfecho agradável à noite. Eu, obviamente, joguei a segunda alternativa na mesa. Tranquilidad, paz. No meio de um boliche em Tilcara, claro. Quem ia acreditar? Não deixava de ser verdade.
¿Y qué es paz? ¿Eso es paz? – disse olhando pros lados, pras pessoas saltando animadas no meio da música alta e dos copos de cerveja.
Sí. Puede parecer raro, pero sí. Y felicidad. Extrañaba una buena cumbia. Estoy tranquila. ¿Bailamos?
E seguimos dançando, e eu, como sempre, me esquivei da urgente resposta à pergunta.
Amor, óbvio que é amor. E quanto amor nesse trajeto, quanto carinho, quanta família! É claro, porém, que amor no contexto da pergunta iria permitir uma interpretação que eu não queria para o momento.

¿Y qué buscas?
Esperanza. Gente. Amor. Libertad.
Eu estou com uma manchinha branca na unha do polegar direito. Ela vai caminhando no seu ritmo até a ponta, até o infinito, até o momento em que deixará de existir. Me disseram que quando aparece uma manchinha dessas na unha é um desejo que se realiza.
Tomara que sim.
Já é, tá acontecendo. E tava mesmo. Ele tinha razão. Amor, gente, esperança, liberdade. As estrelas, a lua despontando atrás da montanha e a cidadezinha iluminada tinham me contado que sim, na noite anterior, em cima daquele cerro.
O amor tava ali, latente em cada passo, em cada olhar, em cada sorriso. Eu não sei muito lidar com o amor, com minhas inseguranças. Mas no final das contas, o mais importante é saber que ele ainda existe. E existe porque existe gente que ama, que põe e encontra sua felicidade nas coisas mais diversas possíveis: seu pueblo, sua ascendência e resistência; numa salada de quinua y queso de cabra (ao som de Tim Maia), num asado de morrones y huevos (ao som de Elvis); no pipa que voa longe acompanhando a corrida da menina naquele sol litorâneo; no cachorro companheiro de trilhas; nas cordas de um charango ou uma guitarra; num té de té com uma família que se tornou sua ainda que nunca tenha sido; no olhar misterioso daquela pessoa querida.
Al final, encontramos mucho, mucho más de lo que buscamosaunque capaz no encontramos nunca lo que salimos a buscar.

Fiquei realmente contente em lembrar que as montanhas eram Apus. Lembrei-me daqueles outros caminhos, em trilhos de trem, rumo à cidade perdida. Caminhar por esses lugares de fato traz uma transcendência inexplicável. Algo de lembrar-se e esquecer-se de tudo, de as memórias aflorarem sem nenhum controle nem pertença, todas ao mesmo tempo, numa enxurrada; algo de ser intensamente você mesmo, e justamente por isso deixar de ser tudo o que se é. Foram quatro vezes que senti isso de uma maneira desconcertante, sempre num caminho alto e depois de uma sequência de deslumbramentos com a natureza: na minha infância Waldorf, quando estava no topo de alguma montanha do Parque Nacional de Itatiaia (Pedra da Mina, acho); quando fazia a trilha (Salkantay) rumo a Machu Picchu; quando andava bordeando o Lago General Carrera, torcendo por uma carona, a caminho de Chile Chico; e no Paseo de Los Colorados, em Purmamarca.
Deslumbramentos, momentos de contemplação, de introspecção e de transcendência foram muitos, na vida, mas esses marcaram pela forma, pela parecença entre eles, pela confusão dos sentidos.

Li numa parede que la buena felicidad dicen que no se nota. Não. É tão levinha a felicidade. Aí dá pra levar pra qualquer lado. É um pouco como se fosse uma nuvem, ou um algodão doce, que a gente nunca sabe muito bem quando se forma ou porque desaparece.


Caminando, caminando, voy buscando libertad. Ojalá encuentre camino para seguir caminando (Victor Jara)
O caminhar nos põe de frente com muita gente, muito querida. Gente que busca, também. Não sei que coisas buscarão, mas acho que no final das contas a busca em si é o mais importante, porque ela te põe em movimento. É a expressão máxima de que ainda há esperança.
E aí, aí onde eu nunca havia sido antes, estão as raízes. E aí fica parte de mim, na poeira, no pólen, no vento, na água, no tempo, nas pessoas. Partes que talvez nunca mais encontre. E o engraçado é que isso, ao contrário de me esvaziar, me leva a caminho da plenitude.
Mas se tantos lugares são hogar, estou fadada a sempre sentir saudades.

...¿Y qué hay, compay? 


terça-feira, 1 de outubro de 2013

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Terceira Grande Guerra



Estamos oficialmente na Terceira Guerra Mundial. Deu ontem na rádio, estão compartilhando no facebook e já está nos top trends do twitter. Eu nunca imaginei que viveria uma Grande Guerra, achei que isso já estava meio superado. Que nem a ditadura. O terrorismo não, isso andava bem na moda, mas isso acho que nunca vi de perto. Agora, a guerra foi oficializada no facebook, e eu estou vendo as fotos e vídeos. Tem gente morrendo, tem gente matando, e eu achava que isso já não existia mais. Ouvia desde pequena, na escola, que o melhor jeito de resolver as coisas era com o diálogo. Ouvi isso a vida toda. Mas os moleques levavam advertências e suspensões, e às vezes eram até transferidos pra escola da rua de cima, que chamavam de “lixão” – era escola de transferência dos piores alunos do Estado. Era difícil conversar. Eu não queria ir pro lixão, óbvio.
Nos trabalhos era tudo resolvido democraticamente... Só uma vez que eu e uns outros funcionários fomos demitidos, eu não sei bem por que, mas eles sempre disseram que queriam nosso melhor, então deve ter sido por bem. E nos outros empregos também, tudo era resolvido em reunião. Eu sou meio atrapalhada, às vezes não sabia da reunião, ou quando ia não entendia bem as coisas, mas tinha gente que pensava em nós.
Essa guerra parece que é diferente. É uma guerra do mundo consigo mesmo. Cada país tem seu motivo e sua luta interna, cada povo tem sua causa. É a massa contra o poder, dizem. A princípio parece tudo a maior baderna, sabe, a casa tá caindo. Mas, por mais que não seja um bloco de países X contra outro de países Y, essas guerras de hoje parecem até que têm blocos mais coerentes, com objetivos mais mundiais.
É horrível, horrível ter a rotina abatida assim, desse jeito. Dá vontade de ser como era, tudo em paz. Mas olha, acho que todo o mundo já ouviu essa história de que o diálogo é melhor, e tô chegando à conclusão de que o diálogo é uma escolha, a menos usada, ou uma mentira, mesmo.
Eu achava que a Terceira Grande Guerra ia ser um negócio bem futurista, com carros voadores, roupas à prova de bala para todos, óculos com laser, um climão hollywood assim. Achei que ia ser contra O Mal, tipo Sauron, ou Os Comunistas, alguma coisa do tipo. Achei que ia ter um mocinho pra me salvar e me amar por toda a vida. HÁ! Amor tá difícil achar, viu. Talvez essa guerra toda seja mesmo porque desaprendemos a amar. Essa também é uma guerra de nós contra nós mesmos, uma guerra para matarmos o tirano que existe em nós.
Parece que esse tempo de conflitos é inevitável, e parece que é necessário. Eu acho que vou arrumar minhas malas, por via das dúvidas. Tô levando dois coquetel molotov. Se alguém precisar de algo é só me chamar no whatsapp. Nos vemos no Novo Mundo!